quarta-feira, 30 de julho de 2008

Selic: tão bem-vinda e tão inoportuna

Por Carlos Moura

Na semana passada o Copom, numa decisão agressiva, aumentou a taxa de juros de 12,25% para 13% para combater a inflação que, por uma série de razões, volta a ameaçar nosso Brasil. Felizmente, por enquanto essa ameaça ou neo-realidade não merece ser chamada de como nunca antes na História do Brasil.

Como essa nova taxa é um fato, não temos muito o que fazer, mas estou procurando entender. Da leitura atenta dos jornais, mesmo os especializados, é quase impossível tirar uma média entre os pró e os contra.

O fascinante é que cada vez fica mais claro que (1) o Brasil só tem a política monetária para combater a inflação; (2) os gastos públicos crescem assustadoramente; (3) os custos de produção de bens e serviços são elevados (burocracia estatal, falta de infra-estrutura, carga tributária e corrupção) e (4) baixa qualidade da gestão pública, demonstrada de forma singela pelo temor dos quadros do Ministério da Fazenda que a dosagem dos aumentos da taxa de juros seja mantida nas próximas reuniões do Copom, reduzindo as taxas de crescimento da Economia em 2009. Tudo indica que a meta é ter a inflação sob controle, para que em 2010 o crescimento econômico retorne, gerando polpudos dividendos eleitorais.

Outro aspecto que me fascina nesse processo – taxas de juros – é a suposta pele grossa do Banco Central – nosso querido guardião da moeda, porque todas as pancadas são contra a instituição e seu presidente. Do outro lado, está o chefe do Poder Executivo que, embevecido pelo sucesso, rema em sentido contrário, pondo mais lenha na fogueira da inflação. Esse processo fica claro para aqueles que conseguem separar o discurso das ações. Tudo indica que, também, no controle da inflação temos o efeito "teflon", ou seja, nada gruda no chefe do Executivo. Se isso é verdade ou não, só o futuro dirá.

O mundo não está mais tão favorável para nós e isso pode criar situações que o blá-blá-blá populista não será mais possível sem graves conseqüências, como por exemplo, dizer para os apóstolos da inflação tirarem o cavalo da chuva, porque faz tempo que não chove.

segunda-feira, 28 de julho de 2008

Obama na Europa e o muro nos EUA

Por Maurício Moura, da Redação

Parei em frente a uma banca de revista e apenas observei um movimento diferente. Absolutamente todos os jornais estampavam o sucesso de Barack Obama em Berlim, diante de mais de 200 mil pessoas.

Diante das manchetes, alguns paravam e diziam: "nossa, olha o Obama na capital da Europa!", (geografia nunca foi o forte dos americanos), outros arregalavam os olhos desacreditados pelo fato de ver um americano levantando simpatia dos "estranhos" europeus.

Afinal, para a maioria americana local, europeu é um povo abstrato, complexo, enquanto "nós da América" somos "objetivos, concretos e simples". Num texto famoso, um dos assessores de Bush afirmou: "Os Estados Unidos são de Marte, enquanto a Europa é de Venus", quando da recusa da Alemanha e outros europeus em apoiar a Guerra do Iraque.

Barack Obama, como de costume, entusiasmou com seu discurso em Berlim. Falou que os muros da humanidade devem cair. Os muros entre judeus e palestinos, entre Ocidente e Oriente e entre os europeus e americanos. Justamente no parque onde o Muro de Berlim passava e dividia a "capital da Europa" entre o mundo comunista e capitalista.

Todavia, Obama esqueceu de mencionar um determinado muro (e que pode ser decisivo para a vitória eleitoral em novembro): o muro da fronteira entre Estados Unidos e México, que Obama, quando senador por Illinois, votou a favor da construção. E pior, as propostas do candidato democrata para a questão da imigração em quase nada se diferenciam das de John McCain e do modelo atual de Bush.

A população latina que representa quase 15% do eleitorado americano tem na imigração um dos principais temas, e Obama, além dos entusiasmados discursos, tem muito pouco a oferecer de diferente. Não custa lembrar que Hillary Clinton teve ampla vantagem nas primárias entre os eleitores latinos.

Ficou a impressão para a comunidade latina nos Estados Unidos que os muros devem cair apenas do outro lado do Atlântico, onde Venus predomina. Porém, em Marte, se depender da Lua do candidato democrata, os americanos poderão até passar a ter um discurso mais abstrato (como o de Berlim), mas sem deixar de lado as políticas bem concretas em relação a muros e imigração.

quarta-feira, 23 de julho de 2008

No futebol, tudo pode acontecer

Por Carlos Moura

O Estado deve garantir aos cidadãos o direito de escolher

Gosto de futebol, mas não sou fanático e uma das boas coisas do futebol são os debates nas rádios e televisões. São discussões infindáveis, cheias de pérolas como “no futebol tudo pode acontecer... nem sempre dá a lógica”.
Isso tudo – nem sempre dá a lógica – me veio à mente quando li as notícias sobre a saída da profa. Elizabeth Farina da presidência do Cade, órgão responsável pela defesa da liberdade de concorrência na economia. A profa. Elizabeth declarou com toda a clareza: “Faltou empenho do governo para reformar a defesa da concorrência.” Nesse caso deu a lógica. A liberdade de concorrência não é um jogo de futebol, mas para nós, cidadãos, é tão importante quanto. Sem liberdade de escolha, perdemos grande parte da nossa cidadania.
Por que deu a lógica? Os pensadores do partido no poder são contra a livre concorrência, querem o controle do Estado sobre a produção, mesmo sendo conhecidos como administradores ineficientes e misturadores dos bens públicos com personagens do setor privado. São também adeptos do partido único, que leva à extinção da escolha política.
Focando na defesa da liberdade de concorrência, esse foi o caminho escolhido pelos países que hoje combinam desenvolvimento e estabilidade política, porque o Estado assume seu verdadeiro papel na economia: garantir aos cidadãos o direito de escolher os bens e serviços que melhor atendem às suas necessidades e seus desejos.
Essa liberdade de escolha é perigosa para quem prega “mantemos nossos compromissos históricos, nossa moral socialista e nossa missão no combate do povo brasileiro por sua libertação”, como fez importante quadro do partido no poder – hoje fora do governo – em seu blog. Ora, se os cidadãos têm liberdade de escolha, podem contestar as ações do partido, podem perceber que há vida além das “bolsas doadas pelos governos” e querer votar em outros partidos. Não podemos ser inocentes: todos os partidos existem para chegar e ficar no poder, mas isso tem de acontecer dentro de regras democráticas, que garantam sempre a liberdade de escolha dos cidadãos.
É liberdade que queremos.

segunda-feira, 21 de julho de 2008

O dia que conversei com Cacciola

Por Maurício Moura

Em 2003, ainda era aluno de mestrado em Chicago, e tive, juntamente com outros colegas de Finanças da Universidade, a oportunidade de escutar por quase 2 horas, o ex-banqueiro Salvatore Cacciola ao telefone direto de Roma. Antes de mais nada, uma aula de mercado financeiro e de Brasil também para o bem e para o mal.

A pergunta de inumeros estudiosos do mercado financeiro naquela dia (a maioria deles não brasileiros) era simples: como o sistema financeiro brasileiro havia atravessado uma mega desvalorização em 1999 e ainda sim saira fortalecido e com os bancos tendo batido recorde de lucros, principalmente nas operações de tesouraria (aquele tipo de ganho não oriundo de serviços prestados aos clientes) ?

Teria sido pela ação ilegal do Banco Central ao vender dólar mais barato para o Banco Marka e o BancoFonteCidam e assim ter salvo o mercado ao evitar a quebra de dois bancos pequenos ? Para ser uma idéia, nunca na história da economia mundial (ou "nunca antes na história desse planeta"), um país tinha atravessado tão bem tamanha crise.

Cacciola tem uma resposta muito simples para essa pergunta. Admite ter realizado operação em foro privilegiado com o Banco Central mas alega te-lo feito na busca de salvaguardar o interesse de seus clientes. Acusa diretamente o governo Fernando Henrique de ter "antecipado" a informação para os principais bancos brasileiros e estrangeiros que operavam no Brasil. Dessa maneira, as tesourarias tiveram tempo suficiente para mudar de posição e apostar a favor do dólar e contra o Real. Com isso, recorde de lucros foram despejados nos resultado dos Bancos.

O ex-banqueiro ainda completa: "todo o mercado ganhou bilhões com a desvalorização e eu que quebrei fico como o ladrão dessa história". E quem pagou essa conta ? Todos os brasileiros, que tiveram de conviver com uma taxa de juros de 45% ao ano, lançada em fevereiro de 1999, para evitar uma fuga maior de capitais.

Muito provavelmente a leitura de Cacciola sobre o episódio esteja correta. O que não esconde o fato do mesmo ter participado de uma operação ilegal juntamente com a Diretoria do Banco Central e que gerou um custo estimado de 1,5 bilhão de reais aos cofres públicos.

Todavia, Cacciola mostrou profundo desconhecimento de Brasil ao fugir para a Itália. Abandonou o paraíso dos contraventores, a terra das garantias dentro da Lei, dos Habeas-Corpus preventivos, das diversas instancias da Justiça e dos super-poderosos advogados de defesa. Os "companheiros" dessa ação ilegal ficaram e continuam a ganhar dinheiro no mercado financeiro. Agora , se Cacciola tiver o que não teve no passado, paciencia, logo estará solto.

quinta-feira, 17 de julho de 2008

O "solta e agarra" e as instituições

Por Carlos Moura

Nos últimos dias vimos assistindo a cenas policiais e judiciais fascinantes. Cada personagem defende sua área de ocupação e atuação com muita galhardia, procurando acima de tudo garantir sua independência. Como quase tudo, há sempre dois lados nas questões. Não estou muito preocupado com quem tem razão ou não, porque todos falam além da conta. Estou muito preocupado com a preservação de nossas instituições democráticas. Não podemos nos distrair, sob pena de permitirmos retrocessos.

O que realmente interessa nesse imbróglio todo é a clara confirmação de que continuamos atrasados como país democrático. As ocorrências que deram origem às investigações e prisões são a maior prova que continuamos a viver como colônia, ou seja, as majestades – mesmo com mandatos por prazo determinado – seguem governando o país como "reis absolutistas", distribuindo favores para seus amigos e correligionários, tudo por conta do erário e entendendo que não têm explicações a dar aos cidadãos.

O curioso é que tais práticas começaram a brotar diretamente em nosso solo faz 200 anos, com a chegada da Família Real, em 1808. D. João VI foi campeão, distribuiu títulos de nobreza com enorme generosidade. O mais triste é que esse estilo de governar perdura até hoje, mesmo com quase 120 anos de República.

É verdade que não há mais distribuição de títulos de nobreza, mas persiste a distribuição de porções da riqueza pública, sob as mais variadas formas, via avanços sobre o caixa dos governos. Há ações diretas e indiretas, mas no fim quem sai sempre perdendo é o cidadão comum, aquele que é menos igual perante a lei que os nobres da República.

Tudo indica, que os personagens presos na semana passada têm muito a nos explicar e possivelmente a nos devolver. Para isso, precisamos ter seriedade, não queremos shows, delírios messiânicos, opiniões baseadas em achismos e muito menos ações ou atitudes que possam colocar em risco nossas instituições democráticas. Não podemos aceitar que tudo o que conquistamos como país seja queimado em praça pública em fogueiras de vaidades.

A bola é nossa, vamos impor as regras do jogo.

terça-feira, 8 de julho de 2008

Movimentos semafóricos

Por Carlos Moura

Já não se sabe em quem podemos confiar

Fui apresentado a esta curiosa expressão idiomática por um querido amigo, quando me relatou sua experiência ao registrar B.O. de acidente de trânsito: espelho lateral quebrado por motoboy. A autoridade policial registrou que o movimento semafórico era favorável ao declarante (meu amigo), ou seja, sinal verde para ele. Esse é o nosso Brasil, até sinal de trânsito é confuso.

O que interessa é que os movimentos semafóricos estão desfavoráveis (vermelhos) para nós, brasileiros. A inflação volta a nos ameaçar e a melhor solução até o momento apresentada pelo chefe da Economia foi comer menos o “nosso feijãozinho”, mesmo tendo de viajar mais de avião, aproveitando a onda de prosperidade. Enquanto isso, o governo continua a gastar cada vez mais, não só com feijão, mas com enormes desperdícios. O que fará nosso viajante presidente para seguir coerente com seu pensamento de peão, como disse um de seus diletos assessores em entrevista à revista “Veja”?
Não se vêem ações concretas para atacar os gastos públicos, para a efetivação de investimentos bem planejados e executados para resolver nossos enormes problemas: infra-estrutura, segurança pública - incluindo a repressão correta aos chamados movimentos sociais (vide MST), que ameaçam as atividades produtivas. As instituições estão destroçadas, os escândalos são diários e crescentes. A corrupção corre solta, as Forças Armadas começam a sentir a quebra da disciplina e a convivência com o crime organizado. A polícia mata cruelmente crianças no Rio de Janeiro. Vivemos tempos tristes, estamos ficando sem ter em quem confiar.
Porém, nosso ministro da Cultura faz shows no exterior. Um dos últimos foi em Washington, EUA, onde nossa embaixada bate recordes de churrascos e shows, mas nada de atrair mais investimentos nem de garantir que o Brasil continue no Sistema Geral de Preferências do governo americano, que garante isenção de impostos para uma série de produtos exportados para os EUA.
Vamos deixar de lado os movimentos semafóricos e partir para outros, antes que seja tarde.